terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Hora de dizer adeus

Ele esticou os braços ainda bronzeados do último verão para abraçá-la. Nem tinha aberto os olhos na cama de lençóis brancos com minúsculas hortências desenhadas, presente da avó que morava no interior de Minas. Mas ela não estava. Pensou que, talvez, ela pudesse estar na cozinha fazendo café. Silêncio. Nem o chuveiro se ouvia. No apartamento duplex do Leblon tudo era silêncio. Depois de se espreguiçar e se contorcer em uma quase ioga matinal, ele coçou a cabeça e foi ao banheiro. Enquanto fazia xixi sentiu falta de alguma coisa, mas não sabia ao certo o que era. Escovou os dentes. Estava muito cedo. 9h45. Era domingo, ele não tinha nada para fazer. Pensou em ir à praia jogar um futevôlei com os amigos. Mas era melhor espera-la voltar. Da padaria, pensou. Ela ficaria brava se não o encontrasse. Ligou a TV.

O controle-remoto estava perdido na mesa onde ainda jaziam as garrafas e taças de vinho da noite anterior. E que noite. Riu. Ela tinha passado o sábado na praia tomando bloody mary do Fasano com amigos gays. Chegou em casa junto com o pôr-do-sol. Linda. E nem sabia. Meio descabelada, com a pele brilhando de suor e marcas de biquíni que destacavam uma pélvis branca de menina perdida em um corpo de mulher. Exalava tesão. Eles transaram assim que ela abriu a porta. Uma foda perfeita. O sal do corpo dela o deixava mais excitado. Ele a lambeu inteira. Ela, meio bêbada, meio mole, o chupou como nunca. Eram as dicas dos meninos gays que ouvira pela manhã, justificou rindo. God save the queens!, ele pensou. Exaustos, ele dormiu. Ela foi tomar banho. Quando acordou, encontrou o jantar perfeito: velas, uma massa com um cheiro maravilhoso saindo do forno e o vinho que mais gostava na mesa. Duas garrafas. Ela pensara em tudo. Não era aniversário. Não era dia dos namorados. Ele não ia pedi-la em casamento. Ao perceber a cara de dúvida dele, ela apenas piscou e disse: “é só para agredecer. À hoje...”. Riu safada.

E como era safada aquela pequena. Desde sempre. Ele se lembrava dela ainda adolescente gemendo no carro prata dele. Sem habilidade. Mas demonstrava um futuro promissor. Ela estudou o riscado. Era boa aluna e gostava de homem. O tempo passou e eles se afastaram. Reencontraram-se. Afastaram-se. Transavam às vezes. Ah, o tempo.

O relógio moderno, comprado em Berlim durante uma viagem, já marcava 20h37. O Faustão se despedia e o domingo estava acabando. Ele não tinha comido nada o dia todo. Estava com fome. Na geladeira, só um pacote de pão integral. Duas fatias. E ela ainda não voltara. Ficou preocupado. Pensou em bala perdida. Nessa cidade, nunca se sabe. Então, lembrou o que faltava no banheiro. A escova de dentes dela não estava lá. Olhou no armário. Nada de roupas. Os livros do Camus também não estavam na estante. Ela não ia a lugar algum sem esses livros – lembranças que carregava de um antigo amante e ele fingia nunca ter existido.

Sentou atônito no puff em frente à TV de plasma desligada. E, de repente, ouviu da memória apagada pelo vinho: “eu te amo, mas há outro”. Um raio cruzou a sala e queimou a história dos dois em segundos. Ele não tinha sonhado. Ela falara essa frase bem baixinho, ao pé do ouvido, antes dele adormecer. Com medo. Ela tinha ido embora.

Por que? Porque ele não a amava. Ele sabia. Ela sabia. Era bom. Mas não era amor. E ela queria amor. Queria ser conquistada. Então, demorou, mas ela foi. No fim, ele nem sentiu muito. Vestiu um jeans e uma camiseta e foi para Santa Teresa beber com os amigos. Solteiros. Ela? Estava na Lapa com uma amiga do ABC que visitava a cidade para os desfiles de moda.

2 comentários:

Cilana disse...

hahahahahahahah
eu amei.
que corajosa ela, vai sim.

Reinações de Narizinho disse...

No fundo, honey, todas somos!
Belive me!