segunda-feira, 17 de março de 2008

Da única vez em que enxerguei claramente

O pai dela era comunista. E ainda hoje, vez ou outra, boicota o McDonalds. O dele, da Polícia Federal - ou algo assim (ela estava bêbada quando perguntou a ele e, óbvio, não se lembra). A mãe dela tinha amigos hippies que fumavam maconha enquanto as crianças rodopiavam fantasiadas de fadas. A dele é herdeira de banco. Ela faz spinning. Ele, ioga. Ela não quer ter filhos. Ele já tem. Ela, por mais que disfarce, é da praia e da areia e odeia cachoeira. Ele, da cidade e do campo. Ela nunca se drogou. Ele até ópio fumou. Ela faz campanha antitabagismo. Ele consome Marlboro box. Ela gosta de casacos de pele. Ele é do PETA. Ela odeia seitas. Ele tomou o chá alucinógeno. Ela anda de ônibus. Ele se diz desapegado, mas sempre teve carro com ar-condicionado e estofamento de couro. Ela gosta dos pés no chão. Ele quer voar.

Além de algumas vodcas, da facilidade dos corpos se reconhecerem durante noites idílicas e da profissão (que ela segue e ele não), não há nada que justifique o que ela sentiu nos últimos nove anos. Nada.

E agora só há vazio.

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