sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Todo meu vazio

Chove. E eu preciso andar três quadras. Só três quarteirões para encontrar você. Paro embaixo da marquise, na frente da farmácia. Os bêbados do boteco ao lado me olham estranho. Meu rímel borrou com a chuva. Minto. Foram as lágrimas. Quem se importa? Minha blusa branca encharcada de chuva está gelada. Minha pele arrepia. Estou sozinha embaixo da marquise esperando a coragem chegar. E os bêbados me acham gostosa. Ou puta. Ou drogada. Falta uma quadra e uma avenida e mais uma quadra. Ou quase. Penso em parar e falar com a menina bonita que é atriz e mora no prédio da esquina. Preciso pedir ajuda. Mas acho que ela não está. Nem tenho intimidade. Meu cabelo já está sem cor. A tinta escorreu com a chuva. Minha blusa está manchada e transparente. Vejo embaçado. Sinto dor. Dentro. Quero voltar. Mas não posso. Quero avançar. Mas minhas pernas não têm forças. Nem minha alma. Preciso de uma vodca.

Lembro do casal de trapezistas que vagava clandestinamente por esses quarteirões. De mãos dadas com o futuro incerto. Deserto. Quero uma mão para segurar a minha, um ombro para encostar a cabeça. E uma toalha quente, branca e felpuda para me secar da chuva. Para secar meu choro. Por que não pode ser você? Porque eu não choro? Mas eu choro e grito e brigo e bato e me suicido se você quiser.

Não vou sair do lugar. Não consigo. A água da chuva entope o bueiro. A enxurrada avança até meus pés. Tenho medo. E se nunca conseguir sair do lugar? Stop waiting, dizia o filme de ontem.

Entre o peito, um espaço que arde. Vácuo que explode em lágrimas. Distância infinita. Para o infinito, basta virar a esquerda e seguir em frente. Começa na minha rua e termina na sua. Descobri isso essa semana. O táxi passou em frente ao seu prédio. Senti frio. E passei gloss. Para ficar bonita.

Distante posso ter você próximo. Guardo a vontade. Acarinho a possibilidade. Próximo, você está longe. E aperta o peito e arde. Congela. Perto, você é todo meu vazio.

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