sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Como me afoguei sem entrar no mar

Tento respirar. Mas o ar está parado. Os edifícios a beira mar estancam tudo que vem de lá. Paralisam Iemanjá. E ainda construíram um prédio maior do que os outros. É como se ele gritasse ali. Como um pavão que abre as asas no meio de pombas pobres. E é feio. É um pavão bege neoclássico. Uma ofensa.

No mais, são as mesmas pessoas, nos mesmos lugares, nos mesmos trajes, com os mesmos assuntos e companhias. Não gosto. Aprendi um caminho seguro por entre essas vidas passadas e ultrapassadas. Ando em linha reta até a Pedro Taques se transformar em Epitácio Pessoa. Sem olhar para os lados. Sem ver quem dirige os carros apressados e com ar-condicionado que circulam nas ruas resfolegantes do verão. E chego onde preciso. Não vou ao shopping. Não vou tomar sorvete. Não vou até ali. Talvez uma solitária água de coco. Sem sorrisos. Sem gentilezas. Só eu e minha vida.

Impossível suportar dias abafados. Nem meus gritos saem. Nem minhas lágrimas. Evaporam com o calor. Impossível agüentar essa passividade. E sinto toda a perda de tempo do mundo naquelas ruas. Sinto os sonhos precários. Os sonhos daqueles que não sonham. Ou sonham pouco. Ou mal. E paradoxalmente vejo estampada a tal da felicidade nesses rostos passivos. Incompreensível para mim.

Almoçando sob o sol da capital – igualmente quente e sufocante – lembrei do homem que corria na praia sem uma das pernas. Uma geringonça metálica o fazia se movimentar normalmente. Naquele homem não vi sonho precário. Vi algo maior do que a cidade pode suportar. Ou eu. E entendi assim – entre uma garfada de alface e filé bem-passado – que não é o lugar. Sou eu.

Porque eu quero mais. Mais do que ver o sol se pôr. Mais do que areia entre os dedos aos sábados. Mais do que um casamento tolo. Mais do que um chopp no bar de sempre. Mais do que aquelas ruas. Mais mais mais mais. Quero mais ar. Quero o mundo para respirar.

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