segunda-feira, 14 de julho de 2008

Lost (in translation)

Ela saiu da ilha pela primeira vez pelas pernas de sua mãe. Ela não queria se afastar do mar e da areia que à noite refrescava sua pele e seus pensamentos. Só retornou quando já era outra. Com o útero escorrendo, deixou o cabelo crescer e a pele bronzear. Selvagem. Ouviu histórias muito diferentes das suas. Os viajantes que vinham de longe traziam novidades. E um LP do Pearl Jam. Ela descobriu que queria ser do mundo – apesar de já sentir-se sufocada entre as paredes com tapeçaria indiana desde criança. Mas foi no embalo da brisa do Oceano Atlântico que entendeu como faria para sair de ilha. Again. E por vontade própria.
Aos 20, com um amor rasgando o coração e um sonho fincado na alma, partiu. Não foram fáceis os anos seguintes. Jung foi convocado para ajudar. Vestido de mulher, estava sempre acompanhado pelo fiel Tomy. Foi útil por um tempo, depois ela optou pelas salas de cinema, tatuou uma estrela na nuca e continuou andando. Da vez que enlouqueceu, trancou-se em casa. Dormiu cem anos. E quando acordou, continuou andando. Encontrou fadas-madrinhas, dragões e lagartos. Dos leões, ficou amiga para não precisar matá-los todos os dias e, das cobras, aprendeu a fazer o antídoto usando o próprio veneno. Às vezes, ela esquece tudo e finge. Às vezes, se arma. Muitas vezes chora sozinha. Mas ela ainda sabe o que quer. Mesmo que só encontre certeza no azul silencioso do 11º andar ou no sorriso cúmplice do homem que a acompanha. Mesmo sem querer (ou saber).
Hoje, ela está em outra ilha. Mais longe. Tão úmida quanto a sua ilha. Tão quente quanto seu sonho. Uma ilha deserta e cheia de gente. Caminhando de um lado para outro. Falando sozinha. Um arquipélago humano. Homens e Mulheres. Todos ilhados. Cercados deles mesmos por todos os lados. Sem pontes.
E ela.
Sem entender bem as direções, anda por ruas que não têm nomes. Sem entender bem o que dizem e nem imaginar o que sonham, ela mistura idiomas em seus pensamentos. E não chega a lugar nenhum. Mas continua andando.

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